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A metade (requentado)*

Publiquei esse texto antes da eleições com algumas modificações. Após a realização do primeiro turno ao governo do Rio Grande do Sul, não pensei em palavras melhores do que essas para exclamar o meu sentimento sobre os resultados…


Nunca o Rio Grande do Sul esteve tão menos misterioso do que hoje. Nunca esteve mais longe de ser esse estado desejado por todos. Em breve, estará feita em farrapos, transformada em uma feira de balões que venderá livros como se fossem cachorros-quentes, a metade de seus habitantes voltarão a comemorar a sua festa de pequenas conveniências. Aquela metade dos gaúchos que adoram aparentar mais do que ser. Não porque não possam. É que não querem ser e o que essa metade é ou no que está se transformando, com cada vez mais veemência faz alguns anos, repugna. Falo da esmagadora maioria que votou em José Ivo Sartori e em Ana Amélia Lemos para governar o Rio Grande do Sul e, provavelmente, elegerá o primeiro sob o límpido voto republicano no segundo turno e que, amanhã, provavelmente, essa maioria, estará escondida embaixo de uma carapuça progressista, como já fizeram aqueles que “não votaram no Collor ou no Britto”, pela vergonha que dará se reconhecerem como mesquinhos.

Aqui a metade dos gaúchos preferirá seguir na tentativa de resolver o mundo nas mesas dos bares, nos táxis, se estonteando, cada vez mais, com profetas do vazio disfarçados de familiares apresentadores de TV porque, afinal, “as pessoas querem se divertir”, assistirão a qualquer evento público em troca de uma foto em alguma coluna social, se incomodarão diante de qualquer ideia ligada aos direitos humanos quase como se falassem “daquilo que não se pode nominar” ou passarão o dia tuitando suas estupidezes que não interessam a ninguém. Sim, é necessário olhar para outro lado e isso afetará os interesses morais e econômicos do chefe do bando e, por fim, sempre, sempre darão importância aos que falam em Deus, nos bons costumes e na família.

Dá asco a metade do Rio Grande do Sul. Faz tempo que venho sentindo isso. É difícil diagnosticar algo tão pesado. Mas pelo futuro que se apresenta, não resta dúvida e descreveria esse diagnóstico assim: “Repulsão pela metade de um estado que soube ser maravilhoso com gente maravilhosa”, “efeito da profunda decepção mediante a loucura generalizada de um estado que já foi modelo e esteve na vanguarda do mundo inteiro”, “ataque histérico de risos que acaba com o humor e conduz à psicose”, “efeito manicômio”. Sinto que o brasão farroupilha se retorcerá ao ver toda essa tropa de ineptos e incapazes sair por suas ruas com uma coroa de ouro na cabeça como se fossem reis, que até lhes corresponderá pelo voto popular, mas que não lhes caberá porque essa coroa não foi ornamentada para suas cabeças.

Não quero eufemismos.

O Rio Grande do Sul quer um governo de direta como apontou o pleito no primeiro turno. E é dessa direita deplorável e doentia. Dessa que se faz de humilde escondendo-se atrás de uma máscara sinistra das forças ocultas imanentes do Brasil, que não entregarão tão facilmente aquilo que sempre tiveram: as rédeas da dor, da ignorância e da hipocrisia deste país. Gente com ideias para poucos. Gente egoísta. Gente sem “swing”. É isso que a metade do Estado do Rio Grande do Sul deseja para si mesma.

*Texto baseado na crônica “La mitad” de Fito Paez.

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